CARTA DE UMA MÃE ALENTEJANA PARA UM FILHO QUE ESTÁ NA BÓSNIA
Mê querido filho:
Escrevo-te algumas linhas apenas pra saberes que tou viva. Estou-te a
escrever devagar, pois sei que nã sabes lêr depressa.
Nã vais reconhecer a nossa casa quando voltares, pois nós mudamo -nos.
Temos uma máquina de lavar rôpa, mas nã trabalha muito bem, a semana passada
pus lá catorze camisas, puxei a corrente e nunca mais as vi.
Acerca do tê pai, ele arranjou um bom emprego, tem 1500 homens debaixo
dele, pois agora está cortando a relva do cemitério.
A magana da tua irmã Maria teve bebé esta semana, mas sabes, eu nã
consegui saber sé menino ou menina, portanto nã sei sês tio ó tia.
O tê ti Patricio afogou-se a semana passada num depósito de vinho, lá na
adega cuprativa, alguns compadris tentaram salvá-lo mas sabes, ele lutou
bravamente contra eles. O corpo foi cremado mas levou três dias pra apagar o
incêndio.
Na quinta-feira fui ao médico e o tê pai foi comigo. O médico pôs-me um
pequeno tubo na boca e disse-me pra nã falari durante dez minutos. Atão nã sabes
que o tê pai ofereceu-se logo pra comprar o tubo ao médico.
Esta semana só chuveu duas vezes. Na primeira vez chuveu durante três dias
e na segunda durante quatro dias. Na segunda fêra teve tanto vento que uma das
galinhas pôs o mesmo ovo quatro vezes.
Recebemos uma carta do cangalhero que informava que se o último pagamento
do enterro da tua avó nã fôr fêto no prazo de sete dias, devolvem-na.
Olha mê filho cuida-te.
Nã te esqueças de beber muito lête todas as nôtes, antes de interrares os
cornos na fronha.
Um Bêjo
Jaquina do Chaparro
PS: Era pra te mandar 5 contos, mas já tinha fechado o envelope, nã tos mandei.
Fica pra próxima, porra.
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